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04/08/22 - Encontro 2 - Grupo de Reflexão - Tempo, envelhecimento e mudanças



04/08/22


"O que as pessoas pensam, sentem e falam quando o tema é envelhecer?"

Inspirado no livro "A Velhice" de Simone de Beauvoir.


Vídeo "A Bela Velhice" de Mirian Goldenberg, psicanalista.


Françoise Dolto foi uma psicanalista francesa que teve grande influência sobre a educação de crianças de seu tempo. Ao iniciar seus estudos de Medicina, em 1932, já pensava em dedicar-se à Pediatria. Mas foi depois de uma análise pessoal, que Dolto iniciou sua carreira como psicanalista, em especial como psicanalista de crianças. E foi a partir dessa experiência de trabalho que desenvolveu um pensamento original sobre a educação de crianças, para uso de pais e de educadores, inspirando-se nos conhecimentos que a psicanálise e sua prática puseram à sua disposição.




A construção de projetos de vida e a busca da felicidade

Como ser uma professora e pesquisadora apaixonada em um país destruído pelo ódio, intolerância e ignorância?


Eu sou o próprio estereótipo de uma pesquisadora apaixonada: introspectiva, tímida, insegura, reflexiva, observadora, gosto mais de escutar do que de falar, prefiro ficar em casa lendo do que ir a festas ou a um boteco jogar conversa fora. Inúmeras vezes fui criticada: "Nossa, você parece um bicho do mato, não se diverte nem relaxa nunca, está sempre trabalhando, estudando, lendo e escrevendo. Precisa se distrair e socializar mais ou vai acabar ficando uma velha triste, deprimida e solitária".


Em novembro de 2021, comecei uma nova pesquisa de pós-doutorado sobre envelhecimento e felicidade. Desde então, meus dias são quase que inteiramente dedicados a ler, estudar e escrever, inclusive nos fins de semana e feriados. Mas continuo dando aulas e palestras, arrumando a casa, fazendo compras, pagando contas, cuidando dos amigos e marido. Durmo, no máximo, quatro ou cinco horas por dia.


Só para dar um exemplo de um dia típico de estudo, ontem comecei ler às 7h da manhã o livro "Rápido e Devagar", de Daniel Kahneman. Na parte da tarde, li "Agilidade Emocional", de Susan David. De noite, reli pela enésima vez "Em Busca de Sentido", de Viktor Frankl.

Como não consigo desligar, de madrugada li "O Corpo Guarda as Marcas", de Bessel Van der Kolk. Grifei a citação das pesquisas de António Damásio e busquei os livros dele na internet. Encontrei dois que coloquei nas minhas prioridades de leitura: "O Mistério da Consciência" e "Em Busca de Espinosa: Prazer e Dor na Ciência dos Sentimentos". Por fim, às 4h da madrugada, assisti ao TED Talk de António Damásio "Em Busca de Compreender a Consciência". Ando fascinada com as pesquisas sobre o funcionamento do cérebro e a superação de traumas.

Passo os dias mergulhada nos livros e artigos científicos. Escrevo nos meus cadernos todas as ideias importantes dos autores. Já tenho mais de mil páginas de fichamentos. Anoto também todas as minhas ideias, buscando relacionar as reflexões dos autores com as minhas próprias pesquisas.


Apesar de ficar doente e deprimida com os crimes perversos e com a sabotagem da ciência brasileira, minha sensação é de "maravilhamento" com tudo o que estou descobrindo nos livros e nas minhas pesquisas. Mas uma angústia me atrapalha: como vou conseguir escrever tudo o que aprendi sobre envelhecimento e felicidade? Como vou conseguir traduzir tudo o que estou aprendendo com a mesma beleza, encantamento e emoção que sinto ao ler cada livro?

Como escrevi no livro "A Arte de Pesquisar: Como Fazer Pesquisa Qualitativa em Ciências Sociais", Einstein afirmou que "frequentemente, a formulação de um problema é mais essencial do que a sua solução". Ou, como disse Pierre Bourdieu, "a pesquisa é talvez a arte de criar dificuldades fecundas e de criá-las para os outros. Nos lugares onde havia coisas simples, faz-se aparecer problemas".


Para uma pesquisadora ansiosa, angustiada e apaixonada como eu sou, não é nada fácil dar tempo ao tempo e saborear cada um dos passos necessários de uma pesquisa científica. Quero chegar o mais rapidamente possível às perguntas certas e, consequentemente, às melhores respostas.


Para amenizar a minha angústia, sempre releio a epígrafe do meu livro "Noites de Insônia: Cartas de Uma Antropóloga a um Jovem Pesquisador". É uma ideia de Rainer Maria Rilke que li, em 2005, na conferência de abertura da Jornada dos alunos do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro:

"O senhor é tão jovem, tem diante de si todo começo, e eu gostaria de lhe pedir da melhor maneira que posso, meu caro, para ter paciência em relação a tudo que não está resolvido em seu coração. Peço-lhe que tente ter amor pelas próprias perguntas, como quartos fechados e como livros escritos em uma língua estrangeira. Não investigue agora as respostas que não lhe podem ser dadas, porque não poderia vivê-las. E é disto que se trata, de viver tudo. Viva agora as perguntas. Talvez passe, gradativamente, em um belo dia, sem perceber, a viver as respostas".

Esta coluna foi escrita para a campanha #ciêncianaseleições, que celebra o Mês da Ciência.


Mirian Goldenberg Antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é autora de "A Invenção de uma Bela Velhice"

Folha de São Paulo. 27/07/2022.


Sugestão: Mário - Membro da A Casa Frida


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INSTANTES de Nadine Stair, atribuído erroneamente a Borges


Se eu pudesse novamente viver a minha vida,

na próxima trataria de cometer mais erros.

Não tentaria ser tão perfeito,

relaxaria mais, seria mais tolo do que tenho sido.

Na verdade, bem poucas coisas levaria a sério.

Seria menos higiênico. Correria mais riscos,

viajaria mais, contemplaria mais entardeceres,

subiria mais montanhas, nadaria mais rios.

Iria a mais lugares onde nunca fui,

tomaria mais sorvetes e menos lentilha,

teria mais problemas reais e menos problemas imaginários.

Eu fui uma dessas pessoas que viveu sensata

e profundamente cada minuto de sua vida;

claro que tive momentos de alegria.

Mas se eu pudesse voltar a viver trataria somente

de ter bons momentos.

Porque se não sabem, disso é feita a vida, só de momentos;

não percam o agora.

Eu era um daqueles que nunca ia

a parte alguma sem um termômetro,

uma bolsa de água quente, um guarda-chuva e um pára-quedas e,

se voltasse a viver, viajaria mais leve.

Se eu pudesse voltar a viver,

começaria a andar descalço no começo da primavera

e continuaria assim até o fim do outono.

Daria mais voltas na minha rua,

contemplaria mais amanheceres e brincaria com mais crianças,

se tivesse outra vez uma vida pela frente.

Mas, já viram, tenho 85 anos e estou morrendo


Sugestão: Membro da A Casa Frida


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Acesso o material de apoio dos encontros anteriores.




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